quarta-feira, 4 de junho de 2008

Hussein Obama


E o Obama foi indicado realmente como candidato do Partido Democrata à presidência dos EUA. Só eu achei muito doido todo esse esquema dele ter que ser indicado pelos delegados do partido, fazendo uma campanha, pra só depois concorrer mesmo com o candidato do outro partido?

Os EUA são um país de marketing. Eles vendem idéias nas quais eles mesmos acreditam e nas quais o mundo também acaba acreditando. A maior das idéias vendidas é a de que eles são uma democracia, sendo que na verdade eles têm eleição indireta. E o que é pior, usam uns métodos de apuração de votos que parece que sairam de um filme de ficção científica dos anos 50, com grandes máquinas de alavancas e cartões perfurados.

Outra idéia vendida é a de que eles têm uma constituição maravilhosa, ótima, que garante liberdade e justiça. Não é verdade. Os estados que formam os EUA têm autonomia pra estabelecer as regras das relações das pessoas com as empresas - relações privadas - e as garantias constitucionais acabam só valendo quando a pessoa se vê perturbada pelo governo. Ou seja, contra o governo pode se alegar um direio constitucional, como o da intimidade, por exemplo, mas contra uma empresa não se pode alegar este direito.

É com base nestas constatações que tem que analisar o Barak Obama. Ele não quer que os EUA saiam do Iraque, não tem política contra a intervenção dos EUA em outros países, provavelmente vai manter o embargo contra Cuba e demonizar a Coréia e o Irã. No que então ele é tão "promessa" assim, como a mídia mais "esquerdinha" dos EUA tem realçado?

Ora, ele garante aquele mínimo de liberdades pessoais - lutar contra a discriminação, direitos das mulheres, direitos das minorias - com um mínimo de liberdades sociais - programas assistenciais do governo, recursos para saúde e educação. E só.

A situação macro dos EUA não é mexida por ninguém, e as nuances da diferença entre o Obama e o McCain são bem pequenas. Aí vem mais uma idéia vendida pelos EUA, a de que os democratas são de esquerda. E são tão de esquerda quanto o Partido da República ou o Democratas aqui no Brasil.

Daí que, mesmo com toda essa semelhança estrutural entre o programa do Obama e o que o Bush faz, o americano médio - que tá cagando pra democracia, liberdade e justiça - ainda vê o Obama como um negro muçulmano. E se bobear vai ser por isso que ele pode vir a perder, mesmo representando risco zero pra esse conservadorismo do homem-médio americano.

6 comentários:

Unknown disse...

Concordo com você que ele não é lá muito diferente do Macacain. Mas ele, e o próprio Macacain, já são bem "menos piores" que o Bush. A presidência do Bush foi uma prova de que o fator humano (na verdade, símio), importa. Os caras inventaram uma guerra do nada e conseguiram foder com a toda a legitimação que a hegemonia norte-americana tinha no resto do mundo após o 11 de setembro. Tudo num piscar de olhos e por pura ideologia neo-con.

Alguns amigos dos EUA têm falado essa coisa, de que qualquer um dos três pré-candidatos já seria um salto de qualidade brutal. Esses meus amigos estão analisando a coisa toda sob uma perspectiva interna. Então, eu acho que para quem vive nos EUA, para quem é pobre e depende do sistema de seguridade social, a eleição do Obama pode melhorar as coisas para eles. Em termos de política externa as coisas não serão tão diferentes assim. Democratas têm um histórico de guerras e intervenção pior do que Republicanos. E a guerra do Iraque é algo que eles não vão conseguir se livrar tão facilmente. Só acho que, como disse acima, o governo Bush foi ruim de maneira delirante, por isso qualquer coisa que entrar depois já vai ser bem melhor.

Olha essa entrevista do Wallerstein de hoje:

OBAMA É RESPOSTA À REAÇÃO CONSERVADORA

Para sociólogo progressista, se eleito, democrata marcará fim da ascensão neoconservadora nos anos 80, ocorrida com a eleição de Ronald Reagan e em resposta às idéias de 1968

A ELEIÇÃO de Barack Obama criará um espaço hoje inexistente para ações sociais nos Estados Unidos. As mudanças que constam do slogan do democrata só ocorrerão de verdade se houver pressão popular. É a entrada da questão social ou de classe na agenda política norte-americana, segundo o teórico de esquerda da Universidade Yale, questão essa que o país esconde atrás do termo "problema econômico".

SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Immanuel Wallerstein está animado. Aos 77 anos, esse sociólogo de esquerda da Universidade Yale acredita que seu candidato, Barack Obama, será eleito e que, se pressionado, reagirá com mudanças sociais nos Estados Unidos. De qualquer forma, para o autor de "O Declínio do Poder Americano" (Contraponto, 2004) e freqüentador do Fórum Social de Porto Alegre, só a candidatura do democrata já traz a questão ao centro da política norte-americana. "Isso é muito saudável, pois, superada essa discussão primitiva de raça e sexo, chegamos à discussão sobre classe, que é para onde caminha essa eleição." É essa questão, defende, que levou as pessoas a comparecerem em número recorde à fase de prévias partidárias, encerrada na última terça, e deve fazer o mesmo em novembro, nas eleições gerais. Leia a seguir os principais trechos de sua entrevista à Folha, por telefone, de New Haven (Connecticut).


FOLHA - A eleição presidencial deste ano ressuscita de alguma maneira as questões de 1968, não?
IMMANUEL WALLERSTEIN - Primeiro, devo dizer que apóio Barack Obama, acredito que ele vá ser eleito, batendo com facilidade o republicano John McCain, e terá maioria no Congresso. Minha análise é à luz dessa hipótese. Assim, a relação é muito simples. Se pensarmos que aquele 1968 quebrou as barreiras para os chamados grupos minoritários nos EUA, sua candidatura é uma das conseqüências. Se pensarmos que 1968 proporcionou uma abertura para os EUA repensarem seu papel no mundo, eis outra conseqüência atual.
Mas não esqueçamos do intervalo no meio do período entre 1968 e 2008, que foi a contra-revolução neoconservadora dos anos 80 [com a chegada de Ronald Reagan ao poder], com a tentativa de fazer o país retroceder à era pré-1968, tanto em termos de influência cultural quanto de economia global. Agora, o pêndulo está indo rapidamente em direção oposta. Onde vai parar é uma incógnita. Mas, em geral, a era dos neoconservadores parece estar chegando ao fim nos EUA e, conseqüentemente, no mundo.

FOLHA - Ainda assim, não é um retrocesso que o país esteja discutindo racismo e sexismo 40 anos depois?
WALLERSTEIN - [Risos] Esse país vem discutindo raça e sexo há cem anos. A discussão vai continuar. O sexismo é um elemento fundamental do capitalismo mundial, não vai sumir.
Mas hoje essa discussão tem menos impacto político imediato nos EUA do que antes. Isso é muito saudável, sobretudo porque superada essa discussão de certa maneira primitiva de raça e sexo, chegamos à discussão sobre classe, que é para onde caminha essa eleição.
Nos EUA nós não dizemos questões sociais, questões de classe, preferimos usar o eufemismo "problemas econômicos", mas é apenas sintaxe para mascarar a realidade. O fato é que a questão mais premente da corrida será a crise econômica mundial em geral e dos EUA em particular.

FOLHA - Classe, não raça, mesmo com um dos candidatos majoritários sendo negro?
WALLERSTEIN - Veja, há pessoas nos EUA que nunca votarão em um negro, como há pessoas que nunca votariam numa mulher. Mas há muito menos do que antes, esse é o primeiro aspecto, e basicamente a maioria, se não a totalidade, já vota em republicanos de qualquer maneira. Então, não importarão do ponto de vista da candidatura de Barack Obama.

FOLHA - Daí o domínio do que o sr. chama de questão de classe.
WALLERSTEIN - Sim. Isso tem levado aos altos índices de comparecimento às urnas até agora nas prévias. E indica claramente que caminhamos para uma participação recorde nas eleições de novembro. E esses votos vêm basicamente de pessoas das classes mais baixas, que normalmente não votam porque não acham que as coisas vão mudar de verdade. Essas pessoas estão sendo impelidas a votar por suas necessidades e porque acham que algo pode realmente acontecer.

FOLHA - O sr. escreveu que a pergunta não é que mudanças um candidato como Obama fará mas sim quais conseguirá fazer. Quais?
WALLERSTEIN - Por ser uma democrata, ele tentará minimizar as perdas dos americanos que foram mais atingidos pela crise econômica. Mas não acho que as ações do presidente dos EUA nesse momento histórico importem muito para a economia mundial. Essa já tem uma dinâmica própria, que passa ao largo da Casa Branca. Acredito que a maior mudança que o próximo presidente poderá fazer será no campo doméstico. Por exemplo, os juizes indicados para os tribunais federais. Poderá reverter a situação terrível deixada pelo governo de George W. Bush em termos de direitos civis e individuais.
Poderá agir para integrar negros, hispânicos e mulheres à nossa cultura política. Essas mudanças são internas, mas muito importantes. E Obama sofrerá uma grande pressão popular para implementá-las.

FOLHA - O sr. não acha que a frustração seria inevitável? A grande expectativa de mudança, e de certa maneira definida por ele em termos tão vagos como foi até agora, não levaria a isso?
WALLERSTEIN - Sim, é indubitavelmente verdade que as expectativas sobre o que ele pode fazer são exageradas. Por outro lado, tudo depende do grau de influência e pressão que os movimentos sociais norte-americanos terão sobre as eleições. Se eles conseguirem fazer as pessoas sentirem que devem ser levadas em conta, certas coisas serão alcançadas. A verdadeira questão é quanta pressão conseguirão fazer depois que ele for eleito. Minha impressão é que a eleição de Obama criará um espaço para ação popular, mas ele não será o ator dessas mudanças, apenas responderá à pressão por elas.

FOLHA - O sr. foi um dos primeiros acadêmicos a escrever que os EUA como potência hegemônica sofreriam declínio. Foi ridicularizado. Sente-se vingado?
WALLERSTEIN - [Risos]Quando escrevi na revista "Foreign Policy" o artigo "The Eagle has Crash Landed" [A águia se estatelou, em tradução livre], em 2002, fui praticamente chamado de maluco. Agora, menos de seis anos depois, muita gente relevante fala o mesmo. Venho dizendo isso em artigos pelo menos desde os anos 80.

FOLHA - Em seu livro sobre "sistema-mundo" [em que analisa o que chama de globalização do capitalismo], os países são classificados em centrais, semiperiféricos e periféricos. Mas a ascensão de economias como Índia e Brasil não é prevista. O sr. não acredita que essas economias possam vir a ser centrais?
WALLERSTEIN - Meu modelo analítico prevê que, sob condições como as atuais, alguns países semiperiféricos como o Brasil podem se tornar centrais. Mas prevê também um espaço limitado para que tais países sejam centrais. Ou seja, alguém tem de sair para outro entrar. Mas falamos de países muito grandes, com populações enormes, e, em termos de acumulação capitalista, não é possível que tantas pessoas acumulem tanto capital, pois há um montante limitado de riqueza, com distribuição limitada. Para resumir uma teoria mais complexa, não acho que os EUA como potência hegemônica serão substituídos por outro ou outros países com as mesmas características. Embora ache que os países do Leste Asiático estejam se tornando mais poderosos.

FOLHA - O sr. esteve algumas vezes no Brasil. Como vê o governo Lula?
WALLERSTEIN - Lula tem sido uma força positiva na política brasileira, mas ele realizou bem menos do que as pessoas esperavam. Tem uma política econômica muito complicada cujo sucesso não é claro no momento. Um dos problemas de Lula é que ele nunca teve maioria legislativa e não tenho certeza se alguém um dia vai ter no Brasil, com o sistema atual. Em geral, no entanto, minha atitude parece com a adotada pelo MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra] nas últimas eleições presidenciais: não há alternativa senão apoiá-lo.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft0906200816.htm

Mão do Macaco disse...

Eu concordo com a tua análise, e não nego a existência de diferenças entre Bush e Obama, nem entre Bush e MacCain, mas eu continuo mantendo que são diferenças de intensidade, o Bush está num ponto mais intenso e o Obama no ponto de diálogo simpático de liberdades individuais e sociais mínimas típicas do individualismo norteamericano.
O foco do meu texto foi o quanto é esquisito o Obama ser identificado como sendo de esquerda, sendo que o que ele propõe de alterações na estrutura social norte-americana são o mínimo daquilo que os governos europeus da social democracia ja haviam inserido no Estado de Bem-Estar Social. Ou seja, ele se preocupar com os menos favorecidos é realmente uma ação de classe, mas não no sentido de pertencer ou atender a uma reivindicação de classe, mas sim no sentido de tutelar de modo paternalista - e por condições inevitáveis - situações econômicas e sociais imperativas. Isso não é ser de esquerda, isso é ser um capitalista bonzinho, e o Wallerstein dizer que ele é de esquerda por conta desse atendimento às necessidades dos menos favorecidos é compreensível na situação do "prefiro o menos pior" mas não torna o Obama ou seu programa algo de esquerda.

Continue postando aqui, suas considerações são apetitosas.

Unknown disse...

O sujeito é um candidato de centro, para os nossos padrões e para os o parâmetro deles lá. É que o Bush é tão delirantemente de direita que faz com que até o Maccain pareça de esquerda. Dos três pré-candidatos democratas com chances reais de ganhar o que tinha um perfil mais de esquerda era o John Edwards. Já dos candidatos democratas que desistiram logo no começo do processo das primárias tem aquele Denis Kucinich que além de ser Vegan (imagina um presidente americano vegan!) era contra a pena de morte, a favor da legalização da maconha, a favor de reatar relações com Cuba, contra o Nafta e a Alca, a favor de impostos progressivamente altos para o topo da pirâmide, quase um social democrata (no sentido escandinavo, não tucano do termo). Olha só: http://en.wikipedia.org/wiki/Political_positions_of_Dennis_Kucinich

Mas um cara "radical" desses nunca teria chances. Só queria que ele tivesse ido mais longe, como foi o Huckabee do outro lado, para colocar alguns assuntos na pauta do dia.

Unknown disse...

o link não saiu

tento de novo

http://en.wikipedia.org/wiki/Dennis_Kucinich

Mão do Macaco disse...

Não sabia desse candidato que você mencionou. Vou ver.

By the way, na Le Monde Diplomatique deste mês tem dois artigos fodões sobre a reativação da IV Frota da Marinha americana - que fica na nossa área - e sobre o Obama. Dá uma olhada - citam o CMI como fonte de informações. Chique, néan?

Unknown disse...

Sabe que há um mês atrás eu descobri por acaso essa reativação do United States Southern Command, que comanda a IV frota. Estava fuçando na wikipedia umas coisas e caí aqui: http://en.wikipedia.org/wiki/Unified_Combatant_Command